Há tempos tive que ver quantos cursos de astronomia e ciências afins tinha dado ao longo destes 10 anos de actividade. A conta chegou a 68 cursos e a qualquer coisa como 1489 horas de formação. Se eu pensar agora que cada curso teve uma média de 20 pessoas dá 1360 pessoas. Se descontar o facto que 25% das pessoas transitaram de uns cursos para os outros, dá à volta de um milhar. Nada mau para quem leva 10 anos disto, pensei cá para mim. Mas o mais importante nesta conta foi o milhar de pessoas que teve contacto com a astronomia. Foram todos aqueles que nunca tinham espreitado por um telescópio, ou que nunca tinham visto Júpiter e Saturno ou que não sabiam como morria o Sol ou que não percebiam nada de galáxias ou que não sabiam o que significa estar em órbita. Muita desta gente guardou as minhas pobres palavras. Sei que muitos esqueceram aquilo que ouviram, mas alguma coisa fica sempre. Outros ficaram mesmo apaixonados pelo tema e tornaram-se amadores. Mas toda esta gente deu-me sustento, pior ainda, pagou para me ouvir falar. Acredito que no meio de tantas horas e de tanta gente alguns terão dado por mal empregue o seu dinheiro e o seu tempo. É um facto que nunca ouvi queixas, mas é impossível satisfazer tanta gente. Sei que nem sempre fiz o melhor que sabia, sei que nem sempre estive à altura das expectativas ou das perguntas, sei que poucas vezes estudei a lição, mas lá me safei o melhor que pude. Com o tempo, lá fui melhorando a performance, a capacidade de convencimento, as propostas para que a astronomia não fosse sempre a mesma coisa. E como o negócio continua florescente e os clientes gostam do produto creio que não me tenho saído mal. Mas gosto sempre de agradecer a este milhar que votou em mim, que pagou para ouvir um tipo que não conheciam de lado nenhum. Agradeço a paciência, o interesse, o gosto, as horas e as noites perdidas. Tudo por causa da astronomia, tudo por causa dessa coisa infinitamente monstruosa a que chamamos Universo. Não diria que esta coisa interessasse tanta gente, que houvesse um milhar disposto a isto. E já agora junto mais um milhar de outros tantos que têm aparecido no Astronomia no Verão ou em palestras que fiz por ali e por acolá. E já agora junto mais uns milhares de miúdos nas escolas que um dia também tiveram que me ouvir. Tanta gente, tantas horas, tantas palavras gastas, tanto sítio onde estive. O que fica depois de tudo isto? Terei dito alguma coisa de especial, alguma coisa que os fez pensar? Terei deixado alguma memória, alguma lembrança, alguma recordação? Quero acreditar que sim. Que alguma coisa ficou nestes 10 anos de pregação.
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